Esta semana diversos veículos de comunicação denunciaram a violência sofrida por uma escrivã de polícia em São Paulo, em 15 de junho de 2009. Para quem assistiu ao vídeo da corregedoria que vasou na internet, o choque e a indignação são instantâneos e inevitáveis.
Quando analisamos as imagens, os absurdos são tantos que fica difícil dizer o que é mais grave nisso tudo. Nunca ouvi dizer que para um processo administrativo (nível em que se dá a ação das corregedorias) tenha validade e produza os efeitos desejados (no caso em questão, o afastamento da escrivã por suposto recebimento de propina) seja necessária a existência de filmagem.
O despreparado delegado que conduz a "operação" tenta o tempo inteiro convencer que é profundo detentor de conhecimentos jurídicos, inclusive faz a citação do art. 249 do Código de Processo Penal Brasileiro. O artigo em questão, no entanto, resguarda às mulheres o direito de serem revistadas por policiais femininas, ou seja, busca exatamente evitar que abusos como o que ele liderou sejam cometidos contra as mulheres.
Além disso, a operação contou com muitos policiais enfurnados numa sala para "enfrentar" uma única mulher, que repete diversas vezes que não se obsta a revista, desde que seja garantido o seu direito de que a mesma seja realizada por policias femininas.
O "douto" delegado, conforme exige o cargo, prestou concurso público e o exercício de seu cargo é privativo aos bacharéis em direito. Ele, portanto, tinha plena consciência da barbaridade de cometia.
Ignorando todos os apelos, o delegado diz que "já perdeu a paciência", ordena que a algemem (outra medida desnecessária, se não há possibilidade de fuga ou agressão, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal) e policiais tiram na marra a roupa da escrivã na frente de 6 homens e 2 mulheres policiais. A conivência dos (e das) presentes demonstra o quanto são frágeis os nossos direitos perante as ditas "autoridades" e, mas do que isso, o quanto o machismo é perigoso e torna, aos olhos de muitos, a violência contra as mulheres algo tolerável.
A incompetência do delegado machão fica ainda mais evidente quando pensamos nas milhões de opções que ele tinha ao alcance da mão: se ia revistar uma mulher, porque não socilitou que uma corregedora o acompanhasse? Por que a filmagem (inclusive da nudez)? Pra que tamanha demonstração de força? Por que deixou tantos homens na sala no momento da revista? Por que não deixou que a revista fosse realizada apenas pelas mulheres presentes? Por que não a levou à Corregedoria?
A escrivã foi humilhada e constrangida ilegalmente. Foi vítima de violência fisica e psicológica.
O "Deuslegado", como homem investido de supremo poder, se sente acima das leis e da dignidade humana. Exibe sua força como o pavão exibe a calda.
É indispensável que as entidades de defesa dos direitos humanos, a OAB e o conjunto da sociedade se manisfestem. As mulheres estão feridas. A Constituição Federal, os tratados sobre direitos humanos, o Código Penal e o Regimento Interno da Corregedoria também. Esperamos que a impunidade não seja o fim desta história.
Fatos como este demonstram que ainda temos muito, mas muito mesmo, que lutar para que nós mulheres possamos exercer autonomia sobre nossos corpos e nossas vidas, sem violência e abusos.
* Tatiana Oliveira é advogada e militante da Marcha Mundial das Mulheres.
2 comentários:
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Obrigada por ressonar nossa indgnação.
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Mais uma vez, obrigada.
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